Casa de Meus Avós, 1976, Votuporanga, São Paulo, Brasil

 

Casa de Meus Avós, 1976, Votuporanga, São Paulo, Brasil
Votuporanga – SP
Fotografia
E lá vamos nós com outro post de lembranças familiares, desta vez da família Carvalho.
Eu gosto muito dessa imagem, especialmente por causa do frango que, sem ninguém perceber, se intrometeu na cena e acabou saindo (e bem!) na fotografia. 
Inclusive, em tom de brincadeira, a chamo de “foto da galinha”.
Introdução e piadas feitas, vamos a descrição da cena: a imagem mostra meu pai Jesus e sua mãe Otávia (minha avó e madrinha de batismo) abraçados em maio de 1976. 
O lugar era a casa de meus avós, no sítio do tio Abraão (irmão de meu avô), na zona rural da cidade de Votuporanga/SP.
Meu avô, na época, trabalhava de meeiro rural para seu irmão, morando com minha avó e a filha Aparecida Tereza em uma das casas do sítio (a casa mostrada à direita).
Na época meu pai morava em São Paulo/SP e trabalhava na Metalúrgica Scai, na rua Visconde de Parnaíba, bairro do Brás, e sempre que podia pegava um ônibus ou um carro próprio ou emprestado para visitar seus pais (não era fácil, especialmente quando tinha que encarar a viagem de ônibus, além da distância ser de cerca de 520 quilômetros, não havia ônibus direto e as estradas não tinham a qualidade de hoje).
Pelo que observei em outras fotografias deste dia, além de meu pai, também estavam no local meu tio Zico (provavelmente veio com meu pai, haja vista que também morava em São Paulo/SP), minha tia Aparecida Tereza e meus avós João e Otávia.
Na imagem meu pai tinha 22 anos, já estava um pouco acima do peso e, provavelmente, com calor (destaques para sua calça boca de sino, camisa em tom rosado e um relógio prateado).
Já minha avó estava com sua roupa “padrão” (nunca a vi com outro tipo de vestido) e o conhecido óculos que sempre usava.
A casa do sítio era bem simples, e embora já tivesse energia elétrica (poste ao fundo), não possuía grandes comodidades, inclusive nem tinha encanamento completo (notem a mangueira preta na parede). Outro fato interessante é o madeiramento do telhado, provavelmente feito a mão no próprio local com os recursos disponíveis no sítio. Também é possível observar parte de uma talha de barro, local onde armazenavam água em temperatura agradável para beber e cozinhar, além de uma bacia ou peneira (não consegui definir).
Ao lado da casa dos meus avós é possível ver outra (não sei dizer de quem) e, ao fundo, a casa de meu tio João (que segundo contam, largou um excelente e bem pago emprego de supervisor na Wapsa em Santo Amaro, São Paulo, para voltar a morar e trabalhar na roça; embora não tenho lembranças dele, sempre escutei de vários parentes que tio João era um cara legal, porém extremamente sistemático, se pegasse bronca de você, te matava em vida; não sei o que o levou a ser assim, talvez algum trauma ou, quem sabe, seja esse nome “João”, parece que todos que o tem são meio complicados…rs).
Continuando, acho que seria interessante contar um pouco à respeito de meus avós (mesmo tendo poucas lembranças deles, e ainda da época que era criança, penso ser válido registrar como eu os enxergava e o que os parentes me contaram durante os anos) e sua história de vida.
Vou começar pela minha avó Otávia, e a primeira coisa que posso dizer a respeito dela, é que sempre a achei meio “brava”, especialmente em relação ao meu avô. Ela sempre reclamava dele para as pessoas, falando que ele era isso, que era aquilo, que era um velho sem vergonha que saía de casa para ficar olhando outras mulheres na rua, etc. Não dava sossego, pegava no pé dele!
E, ao menos na minha visão, meu avô era um cara quieto, tranquilo, não brigava e nem discutia com ela, limitava-se a negar as acusações e reclamações.
Outro fato que lembro é que ela tinha um papagaio que tratava como filho, ela adorava o bicho, conversava e servia café na xícara para ele (para desespero de minha mãe, que fazia de tudo para não tomar café na casa dela por este motivo).
Eu e outros primos achávamos (na verdade tinhámos certeza) que minha avó gostava mais dos filhos da tia Elisa (Luciano e Cléia). Era algo que não tinhámos dúvida, mas, para dizer a verdade, não nos importávamos muito com isso, era apenas conversa de criança. De verdade, foram poucas vezes que minha avó chamou minha atenção (até porque eu não dormia lá, ficava na casa de outros parentes, especialmente tia Nair). Não tenho nenhuma lembrança ruim com ela. Inclusive, lembro que ganhei dois presentes: o primeiro foi uma “fruta de plástico” da fruteira (foi na hora, ela disse que não tinha nada ou um presente melhor para me dar, e pegou uma fruta de plástico da fruteira da casa dela e me deu; minha mãe, em tom de reprovação, fala disso até hoje…rs); o segundo foi uma nota de 50, não lembro que dinheiro era (acho que deu para comprar alguns gibis, um baita presente levando-se em conta sua situação financeira).
Também gostaria de mencionar que ela era minha madrinha de batismo, junto com meu avô, e tinha um quadro grande com uma fotografia minha bebê na casa dela (provavelmente dado por meu pai, quadro esse que hoje está comigo).
Vendo com os olhos de hoje, acho que ela foi uma mulher que passou por diversos sofrimentos e dificuldades na vida, vivendo sem dinheiro, tendo doze filhos e pouco conforto, inclusive passando por períodos de doença que quase a mataram, ficando internada em hospitais por grandes períodos, gerando situações que a forçaram a tomar decisões muito difíceis envolvendo sua própria família. Tais situações devem ter tornado “Dona Otávia” (o jeito que meu pai chamava ela) uma rocha, uma mulher que teve que se virar com o pouco que tinha para dar conta de criar sua enorme prole e mantê-los no caminho correto. E nesse particular ela não era boazinha ou amorosa, se o filho merecesse o corretivo chegava sem dó! E se aos olhos de hoje tais métodos pareçam errados, naquela época não eram assim considerados. Inclusive, era o “método” que ela conhecia, que a vida lhe ensinou. É um erro julgar atitudes de ontem com os olhos de hoje, são contextos e realidades diferentes.
Mas, mais importante, ela conseguiu criá-los, mesmo passando grandes dificuldades, nenhum deles se envolveu com coisas erradas; não são exatamente uma família amorosa (longe disso), mas ao modo deles, todos seguiram em frente e fizeram suas escolhas.
Feitas essas considerações, chegou a hora de falar um pouco sobre meu avô João (conhecido como “João Pedrinho”), que é a inspiração de meu primeiro nome.
Penso que a primeira coisa que tenho que falar, é que não tenho nada de ruim ou estranho para falar dele. Sempre estava bem vestido (para o padrão dele) e com seu chapéu, cumpria suas obrigações e, junto com minha avó, conseguiu criar 12 filhos com o pouco que tinha (em verdade, não consigo imaginar como conseguiu, talvez devesse ter investido em uma televisão, teria feito menos filhos…rs).
Era trabalhador e, acho que deve ser mencionado, perdeu um dedo em um acidente em uma máquina beneficiadora de arroz (era algo que eu notava na posição de sua mão quando estava conversando). Inclusive, corroborando o fato de ser trabalhador, a própria fotografia é uma prova inconteste dessa qualidade, na época dela (1976) meu avô tinha 70 anos ou quase (ele nasceu entre 1906-1908) e ainda estava trabalhando na roça! Se um homem desse não é trabalhador, quem é que é? Eu? Você? 
Gostava de conversar com os amigos, jogar cartas (especialmente “bisca”) e, no fim da vida, se tornou evangélico (lia muito à respeito e chegava até a um certo radicalismo sobre o tema).
Herdou um sítio de seu pai, que acabou vendendo, passando a trabalhar de empregado na propriedade, fato que sofreu recriminação de parte dos filhos durante toda vida. Uma vez confrontado sobre tema, deu sua explicação: “Eu não tinha dinheiro para tocar o sítio e também não tinha como meus filhos estudarem na roça”.
Não sei quanto a meu pai, tios e tias, a mim sua explicação soa verdadeira. Deve ter sido uma decisão difícil, não tenho dúvida que acertou. No seu lugar, a maioria das pessoas teria feito o mesmo, a diferença é que alguns não tem coragem de dizer ou assumir. 
Quase esqueci: quando criança, uma vez tomei uns tapas de meu avô, estavam asfaltando uma rua próxima da casa em que eles moravam em Américo de Campos e fui “acompanhar a obra”. Como eu era “engenheiro”, resolvi pisar no piche asfáltico. O resultado foi que estraguei o chinelo (Havaianas “legítimo”) e ainda sujei a casa dele com o piche. Mas nunca tive bronca por causa disso, tirei a calma do velho naquele dia, mereci o corretivo…rs.
Concluindo esse texto, acho que já escrevi bastante, inclusive muitas coisas sem relação com a fotografia, vou registrar uma divertida passagem com meus avós e pai que nunca vou esquecer: 
“Meu pai estava há um bom tempo sem ir na casa de meus avós (morávamos em São Paulo, eles em Américo de Campos) e resolveu ir sem avisar ninguém (eu e ele de Volkswagen Fusca).
Chegamos à noite, acredito que entre 19:00-20:00 hrs, meu pai abriu o portão da casa, entrou no alpendre e parou na porta da sala, sem entrar e ficou olhando para eles, eu ao seu lado.
Meus avós estavam sentados no sofá, assistindo novela ou jornal, não lembro direito. 
Ficamos nos olhando mutuamente sem ninguém falar nada, meus avós não estavam nos reconhecendo (estava de noite e fazia tempo que meu pai não aparecia por lá). 
Continuamos nisso por uns 40 segundos até que meu pai não aguentou e disse:
– Mãe, sou eu!
Ao passo que minha avó respondeu:
– Ah, Otávio!, confundindo meu pai com um de seus irmãos.
Meio decepcionado, meu pai retrucou:
– Não, mãe, é o Zuza!, dizendo seu apelido de infância.
Minha avó não perdeu o rebolado e arrumou a situação:
– Ah, Zuza!, e levantou para dar um abraço.”
Eu nunca vou esquecer disso, é 100% verdade, eu estava lá…rs.
Nota do blog: Data 05/1976 / Crédito da imagem para Jesus Fernandes Carvalho.
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Andrea Belloti

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